Suicídio poderia ser evitado se sinais não fossem banalizados
Agência Brasil – Mais de 800 mil pessoas cometem suicídio a cada ano
no mundo. No Brasil, o último dado do Ministério da Saúde mostra que em
2014 foram mais de 10.600 casos no país.
Segundo a coordenadora da Comissão de Combate ao Suicídio da
Associação Brasileira de Psiquiatria, Alexandrina Meleiros, 98% desses
indivíduos tinham transtornos mentais, como depressão, transtorno
bipolar, esquizofrenia, dependência de drogas. Hoje (10), é considerado o
Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio.
Dificuldades como as que vêm com a velhice, crises financeiras,
solidão, fim de relacionamentos amorosos são considerados fatores de
risco para o suicídio, já que funcionam como gatilho para desencadear
crises dos transtornos. “Mas isso não quer dizer que quem tem transtorno
vai se matar. Essa é uma condição necessária para o suicídio, mas não
suficiente”, ressaltou Alexandrina.Para a especialista, de cada dez
suicídios, nove poderiam ter sido evitados com diagnóstico e tratamento
corretos dos transtornos. “A maioria das pessoas, cerca de 70% delas, dá
algum tipo de sinal [de que pensa em tirar a própria vida], mas muitas
vezes os sinais são banalizados. Frases como: a vida não vale mais a
pena; melhor morrer; queria desaparecer são sinais de alerta. Esse
alerta é um pedido de ajuda comum, pois todo suicida tem uma
ambivalência: ele quer morrer porque quer fugir dos problemas, mas
também quer ajuda”, explicou a psiquiatra.
De acordo com a Fundação Oswaldo Cruz, a maior parte das pessoas que
pensa em cometer suicídio enfrenta uma doença mental que altera, de
forma radical, a percepção da realidade e interfere no livre arbítrio. O
tratamento da doença é a melhor forma de prevenir.
Quem convive com essas pessoas, como colegas de trabalho, parentes e
amigos, são os que mais podem perceber os sinais de que alguém pensa em
desistir da própria vida. “A pessoa mudou o comportamento, ficou mais
triste, mais desanimado, passou a faltar o trabalho, não rende do mesmo
jeito. São vários os indícios de reações depressivas ou quadros
depressivos de maior severidade, que podem levar ao suicídio”, disse a
psiquiatra. Ela aconselha que quem perceber esses sinais dê atenção, se
disponha a ouvir e sugerir acompanhamento especializado, caso
necessário.
Idosos
A mortalidade por suícidio é maior entre os idosos. As limitações
físicas, perda de autonomia, morte de entes queridos são fatores
relacionados aos casos nesta faixa etária, segundo o presidente da
Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG), José Elias
Pinheiro.
“A depressão no idoso é o maior fator de risco daqueles que tentam
contra vida e o diagnóstico não é fácil, não existe um exame sorológico
que diga que o paciente tem depressão. Muitos sinais como ausência do
convívio social, o recolhimento, podem ser vistos como algo que faz
parte do processo natural de envelhecimento, porém, se esse
comportamento for diferente da rotina anterior da pessoa, pode ser um
sinai de alerta para procurar ajuda profissional”, ressaltou o
profissional.
De acordo com o geriatra Ulisses Cunha, 70% dos casos de suicídio
nesta fase da vida podem ser atribuídos à depressão, além de psicoses,
demências e abuso de drogas, como álcool.
As estatísticas apontam o maior número de suicídios ocorre entre os
65 e 70 anos de idade. Os especialistas recomendam que os idosos não
fiquem sozinhos em datas marcantes, como morte de um ente familiar ou
aniversário, pois são momentos que servir de gatilho para pensamentos
destrutivos.
A sociedade médica também alerta para o “suicídio passivo-crônico” –
ou seja, um suicídio lento, não claramente manifesto. Pinheiro explica
que geralmente esse tipo de suicídio ocorre quando o idoso recebe o
diagnóstico de alguma doença crônica, muitas vezes progressiva, mas que
não tira a capacidade cognitiva. “Nesse processo progressivo de perda da
independência, o indivíduo mantém o grau de lucidez, e vê a
independência comprometida, precisa deixar de fazer atividades diárias,
como fazer asseio, ir ao banco. Ele começa uma recusa a se alimentar, a
usar medicamentos, deixa de ter atitudes que o põem em risco, como
provocar quedas. O indivíduo vai negando as funções básicas, como
ingerir alimento e água”, descreve Pinheiro.
Adolescentes
Enquanto o maior índice de suicídio está entre os idosos, a faixa
etária entre 15 e 19 anos registrou o maior aumento de mortes. A alta de
casos nesta faixa etária chegou a 30%, superior a10,8% na média
nacional entre 2000 e 2012.
“Vários fatores estão levando nossos jovens a se matarem mais. Lares
desfeitos, aumento do abuso de drogas, aumento do alcoolismo, os jovens
perderem o sentido do verbo ser e passaram a valorizar o verbo ter. É o
imediatismo, o consumismo, fatores que fazem com que os jovens não
desenvolvam tolerância para frustrações e diante delas, acabam optando
por tirar a própria vida”, disse a psiquiatra Alexandrina Meleiro.
Fatores de proteção
Profissionais preparados para lidar com essas situações, informar
população, reduzir o acesso aos meios de execução e acompanhamento
profissional podem evitar as mortes. “A espiritualidade também é
considerada um fator de proteção. E não estamos falando em religião, e
sim em crença, até ser ateu. Ter uma crença afasta a possibilidade de
pensamentos suicidas”, acrescentou Alexandrina.
Para a especialista, a atenção básica de saúde deveria estar
preparada para identificar sinais de alerta, ter familiaridade com o
assunto e encaminhar o paciente para o serviço especializado, mas essa
não é a realidade no sistema de saúde brasileiro. “O paciente com perfil
suicida precisa de pessoas com familiaridade com o assunto. Muitas
vezes uma palavra não positiva pode detonar o gesto suicida, cada vez
mais o profissional tem que estar familiarizado com o assunto para ter a
possibilidade de mudar um destino que poderia ser trágico daquele
paciente”.
Dados do Ministério da Saúde mostram que em 2014 foram registrados
10.653 óbitos por suicídio no Sistema de Informação de Mortalidade, taxa
média de 5,2 por 100 mil habitantes, praticamente metade da média
mundial (11,4 por 100 mil). Na Argentina, a taxa é de 10,3 por 100 mil
habitantes; Bolívia (12,2), Equador (9,2), Uruguai (12,1) e Chile
(12,2).
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 30% dos
suicídios no mundo ocorrem por envenenamento com pesticidas, a maioria é
registrado em zonas rurais de países com baixa e média renda. Outros
métodos recorrentes são enforcamento e uso de armas de fogo.
O conhecimento dos métodos de suicídio mais utilizados é importante
para a elaboração de estratégias de prevenção que têm se mostrado
eficazes, como a restrição de acesso aos meios de suicídio.
Nenhum comentário:
Postar um comentário